quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Cala a boca, Mustaine!


Dave Mustaine fez Endgame, o novo álbum do Megadeth. O álbum marca a estréia de Chris Broderick, um anônimo para o grande público, mas velho conhecido para quem acompanhava a cena heavy metal norte-americanas, pois além de auxiliar o Nevermore nos shows como segundo guitarrista, fazia parte do grande Jag Panzer desde 98.

Endgame é um bom álbum. Broderick é um guitarrista fantástico e essa qualidade foi explorada absurdamente pelas novas músicas de Mustaine. Algumas faixas parecem ter sido feitas para evocar o Rust In Peace, mas a performance da banda como um todo deixa bem claro que estamos em 2009. Andy Sneap também colabora muito pra isso, e em cada música é possível distinguir sua assinatura na produção.

Mas se Mustaine fez um álbum tão bom, por que é que ele não está em todos os lugares, em todos os veículos especializados em heavy metal, e fazendo tanto barulho quanto ele dizia que iria acontecer?

Minha teoria é simples. Mustaine não para de falar sobre o Metallica. Claro, ele deve falar sobre o novo álbum também, mas cada entrevistador que o pega pela frente só quer saber de uma coisa: dos onze meses em que foi guitarrista do Metallica. E Mustaine não sabe ficar quieto com relação a isso.

Nos últimos meses Mustaine já falou sobre seus ex-colegas e suas atitudes como amigos/inimigos/músicos, Death Magnetic, a presença dos ex-companheiros no Rock And Roll Hall Of Fame, e diversos outros assuntos que envolvem o Metallica de uma forma ou de outra. Ótima publicidade... para o Metallica.

Se ele tem um trabalho tão bom em mãos (e de fato tem) não seria mais lógico divulgá-lo exclusivamente? Tenho certeza de que ele tenta, na verdade, mas cada vez que ele abre a boca pra falar sobre o Metallica Endgame vira assunto secundário. Na verdade, eu até já li uma entrevista em que Mustaine fala o quão bom seu álbum novo é. Mas seu comentário foi justamente de que Endgame é melhor que Death Magnetic.

Mustaine não precisa disso. Endgame é melhor que Death Magnetic, como é melhor que inúmeros álbuns lançados nos últimos anos. Mas se é o caminho dessa “auto-promoção” esquisita que o cara escolheu, então é bom ir se preparando para uma futura decepção, pois ninguém vai lembrar de Endgame, só de suas desavenças com o Metallica.

E agora, para finalizar e justificar todo o meu comentário, vou ouvir o último álbum deles. Do Metallica, claro.

domingo, 4 de outubro de 2009

Björk: Choose your Side zine is dead


Fui convidado a fazer parte desse blog pelos meus bons amigos André e Daniel e vi que entre os seus membros está Guilherme Chirinéa, que também fez parte da turma de colaboradores do falecido Choose Your Side Zine, cujo criador, Fábio Gonçalves Ferreira, está agora cursando Jornalismo na UFAC e Artes Visuais na UnB, dedicando-se mais a um blog nesta última área. Pode ser que o site do CYS zine volte à ativa algum dia, afinal comebacks viraram a regra no mundo do rock n'roll. Enquanto isso não acontece, vou iniciar minhas atividades aqui com um texto inédito, feito para o site do Choose Your Side há cinco anos e que não foi publicado por complicações tecnológicas. Já está desatualizado em certo sentido: o Faith no More voltou com Mike Patton nos vocais, para confirmar a regra. No entanto, mantenho minha opinião sobre o CD analisado. Mantive a formatação de texto que o Fabinho me pediu na época, com os nomes das músicas. Só deixei de atribuir uma nota para o CD porque odeio isso. Parece-me bobagem críticos de música (ou meros resenhistas) bancar os professores em relação a artistas. Por fim: o que a Björk tem a ver com o perfil do CYS zine ou deste blog? Nada. Por isso mesmo aí está o texto.


Artista: Björk

Álbum: Medúlla

Ano: 2004

Gravadora: Wellhart Ltd/ One Little Indian/ Polydor/Universal

Origem: Edição nacional do Cd

01 – Pleasure is all Mine

02 – Show me Forgiveness

03 – Where is the Line

04 – Vökuró

05 – Öll Birtan

06 – Who is it (carry my joy in the left, carry my pain on the right)

07 – Submarine

08 – Desired Constellation

09 – Oceania

10 – Sonnetes Unrealities XI

11 – Ancestors

12 – Mouth’s Cradle

13 – Midvidukags

14 – Triumph of a Heart

Confesso que não gostei na primeira audição. Não é fácil. Um amigo me explicou que havia um conceito em Medúlla: a negação da banalidade que tomou conta da música eletrônica. Que idéia idiota. A dance music já era fútil quando Björk se meteu com o gênero, no início dos anos 90, ao abandonar o Sugarcubes – new wave extemporânea, uma espécie de B52’s gélido, vindo direto da Islândia. Apesar das músicas de Björk serem interessantes, diferentes, sempre achei Sugarcubes muito melhor.

O que me atraiu foi a presença de Mike Patton (do Fântomas, Tomahawk e Mr. Bungle; mas, no Brasil, mais do que em qualquer outro lugar, eterno ex-Faith no More mesmo). Ouvi seus álbuns solos nos anos 90, com experimentos vocais, pouca ou nenhuma instrumentação, e Medúlla vai além, na mesma linha. Talvez seja mesmo um marco, como provavelmente pretende sua autora, ou talvez será lembrado apenas com estranheza, décadas adiante. Veremos.

Pleasure is all mine abre o disco com a participação de Patton, que auxilia as vozes femininas a providenciar uma atmosfera etérea para Björk soltar a voz. Ouvir esta música tarde da noite, com as luzes desligadas, não tem o mesmo efeito de ouvi-la durante o dia.

O ponto crucial de Medúlla é este. Ou incorpora-se o espírito da coisa, ou nada feito. Quem não atravessar a arrebentação e mergulhar nas músicas vai estranhar muito. Show me forgiveness trata de culpa à capella, seguida da caótica Where is the line, mais próxima das demências de Patton, ainda que não tão aleatória. Outras participações especiais – entre tantas outras - são do Matmos (duo de San Francisco que fez um álbum com sons de cirurgias) e de Robert Wyatt, lenda viva do rock progressivo, ex-membro do Soft Machine e do Gong. Portanto, tome experimentalismo. Submarine é inapelavelmente chata, só deve agradar os fãs de Wyatt, que, no entanto, providencia samples vocais memoráveis para Oceania. Alguns efeitos fazem pensar em cantos de sereias. A letra atiça a imaginação, com Björk bancando uma “mãe Oceano”.

Vökuró e Midvukags, cantadas em islandês, têm em comum o tom solene e triste. Ancestors soa como um lamento, mas não há letra no encarte, se é que isso ajudaria em algo. Triumph of a heart e Who is it... (curiosamente, a que tem participação do Matmos) são as, aham, “pop”. Os malabarismos vocais como imitação de instrumentos reais afastam qualquer traço de normalidade. Os climas se alternam. Desired Constellation é de uma beleza sutil, os efeitos eletrônicos resumem-se a mero white noise. Enfim, um álbum cheio de mistérios, “cabeça”; até um trecho da poesia de E.E. Cummings é musicado. Qualquer um que pertença à porção sã da humanidade, entretanto, pode compreender: “Preciso de um abrigo para construir um altar longe de todos os Osamas e Bushes”, canta a deusa esquimó em Mouth’s Cradle.

Daniel Souza Luz